DE PASSAGEM...

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Morri há 30 anos...

Faz hoje 30 anos que morri...
E ainda cá estou.
Será que alguém ainda se lembra do dia 13 de Junho de 1981, o mais quente dos ultimos 100 anos?
Pois eu lembro-me, não do dia por completo, mas quase, e senti bem na pele.
Dia da cidade de Lisboa, prova de ciclismo, de que já não me recordo do local da partida, mas sei que a chegada era á Av. da Liberdade.
Perto da Ota, juntei-me a mais 2 que saltaram do pelotão para perseguir um colega meu que vinha em fuga.
Eu tinha acabado de ir ao carro buscar água e distribuir pelos meus colegas, e nem reparei que me estava a meter numa aventura, quase sem água.
O calor era mais que muito, a equipa tinha um carro lá na frente com o meu colega e o outro no pelotão. Óbvio que naquela altura não havia os meios de comunicação que há hoje.
Como não colaborava na fuga, nem coragem tive para pedir ou aceitar agua dos carros dos outros dois, nomeadamente do meu grande amigo Bessa Gomes.
Os kilometros foram passando, a sede cada vez era maior, e lebro-me muito bem que, por conhecer bem o local, ia parar logo á saida da ponte de Trancão, pois havia ali um fontanário do qual eu já era cliente habitual nos treinos. Azar o meu...nem cheguei a parar, pois tal era o calor, que nem gota de água de lá saía. Passagem em Moscavide, inicio de tonturas, entrada da Infante D.Henrique e...”desliguei”.
Diz quem viu, que deixei de pedalar, tendo mantido o equilibrio até chegar em frente á antiga Galp, onde acabei por tombar, ja praticamente parado, e sem qualquer ferimento no corpo.
De ambulância até Santa Maria, onde dei entrada ás 13h...bela hora.
Nessa altura, o meu pai, que vinha num carro de apoio de uma outra equipa, e tinha ficado no local onde me tentaram reanimar e me acompanhou ao hospital, telefonou ao meu grande amigo de infância, e na altura finalista de medicina lá em Santa Maria, a alertá-lo do que se tinha passado.
Sorte que ele foi até lá...
Macabro ou não, bizarro ou nem por isso, eram 14h e eu já tinha o lençol por cima.
Tinha sido dado como morto.
Acho que só me faltava a etiqueta no dedo do pé.
Ele falou com os médicos de serviço, já seus conhecidos do estágio, e lá me deram mais umas doses cavalares...
Rezam as crónicas que, quando despertei até preguei uma estalada a uma enfermeira...que me meteram algalia e estava numa marquesa, e por alta recreação levantei-me para ir á casa de banho e fui direitinho ao chão...
Também dizem as “más-linguas” (mas falam verdade), que fui amarrado á marquesa para não fazer mais asneiras.
Em concreto, apenas me lembro que, ao começar a “voltar” ao reino dos vivos, começei a ver as arestas do tecto todas desfocadas.
Entre a Praça José Queiroz e aquele momento...tinha ido de férias.
Também me lembro que estreava uns calções de licra, e sem que tivesse qual ferida, alguém meteu a tesoura e abriu-os ao meio...malandros...ou malandras.
E por fim, lembro-me de me terem dado qualquer coisa de comer, salvo erro, uma sopa.
Seguiu-se a alta e ás 21h estava em casa a jantar....
Resumindo: entrada em Santa Maria ás 13h, dado como morto ás 14h e ás 21h em casa a jantar.
Sá ao sair a porta do hospital é que soube o que me tinha acontecido e onde estava, quando perguntei ao meu pai e a resposta foi “insolação” e “Santa Maria”.
Depois fui sabendo dos promenores, incluindo na tentativa de reanimação, onde me terão despejado água pela cabeça abaixo, mas nem assim eu “acordava”.
Trinta anos passados, ainda por cá ando...mas quantos não estarão já debaixo de terra, porque os médicos não tentaram tudo para lhes salvar as vidas?
OBRIGADO João, tu sabes bem que é a ti que devo o facto de ainda por cá andar...e nessa altura, ainda tu não eras médico.
Ou talvez...Ganda malandro, que me fizeste andar a aturar estes politicos e passar estas crises todas...e o pior ainda está para vir.

4 comentários:

david estrela disse...

parabéns vitorino,bonito texto!
um abraço
david estrela

Anónimo disse...

Bem vindo senhor defunto... bela história para contar um dia aos netos. teve a sua graça... bem aja Doutor Caldeira já uma vez me salvou a mim do mesmo mal.

Eddy Fachadas disse...

Como não me poderia recordar desse dia amigo?Foi na altura do Prémio de Torres vedras, corremos com 47º o circuito das 5 voltas a Mafra, 90 corredores à partida, 19 à chegada, a organização teve a necessidade de arranjar um prémio extra para não desistir-mos,5 mil escudos, caíram que nem ginjas!!!Nunca me esquecerei a bicicleta mesmo a descer não andava, poiis o alcatrão estava completamente derretido e impedia o andamento desta, obrigando assim a um esforço ainda maior.Nesse ptémio ganhei 2 etapas à campeão!!!

João Morgado disse...

Parabéns Manuel pela excelência do texto e não se arrependa de estar a passar por esta crise. E amigos desses há que mantê-los com todo o carinho.
Um abraço